- Foge Shopie… - tentou murmurar Jenks. Estava ferido.
Queria ajuda-lo, mas não sabia como. Estava em pânico, não sabia o que fazer ou
dizer, balbuciei o primeiro cliché que me veio á cabeça.
- Não sem ti, Jenks. – rasguei o vestido e com um pedaço de
pano de seda seco, envolvi o braço dele na esperança de parar o corrimento de
sangue. Ele pegou-me na mão para parar e com a outra secou-me a pequena lágrima
que se encontrava ao canto do olho e puxou-me contra ele, fracamente e murmurou
ao meu ouvido.
- Shopie… Eles querem-te. Foge e faças o que fizeres, não
digas quem és e não largues o colar. Agora vai, foge! – largou-me e desistiu.
Senti as lágrimas a escorrem-me pelo rosto e não sabia bem porquê. Tinha de ir,
não valia a pena ficar ali a olhar para o
que já estava feito. Peguei na espada dele e subi aquele labirinto de
escadas num abrir de olhos, mas encontrei-me encurralada entre cinco homens. Homens
não. Piratas. Velhos, imundos, vestidos com trapos e com armas apontadas ao meu
pescoço pálido e fino. Estava condenada o que podia fazer? Apenas render-me e
esperar ter uma morte simples. Sabia que tinha uma espada na mão mas não a
sabia utilizar, ainda acertava em mim. Termia por tudo o quanto era sitio e não
conseguia fingir isso.
- Então boneca? Estás bem? Pareces nervosa… vais usar isso
ou não? – perguntou um dos homens, devia ser o chefe ou capitão tanto faz.
Apontou para a espada de Jenks que ainda não tinha largado, mas também sabia
que não a ia utilizar, não tinha forças nem coragem. Ele tinha razão estava
nervosa, não sentia as pernas, não tinha força para me aguentar em cima delas.
Queria espetar-lhe aquela espada e fugir, mas não conseguia. Senti novamente as
lágrimas a saírem-me livremente. Porcaria. Agora sabiam que estava vulnerável,
sabiam que era fraca e estava sem defesas. Recomeço a pensar nessa manha do
destino. Talvez seja mesmo verdade. Talvez o destino me tenha levado até este cerco,
até este fim. Fechei os olhos e aguardei pelo pior enquanto ouvia-a o riso dos
cinco homens, não ia implorar pela vida, seria demasiado deprimente para ser
verdade. Aguardei.
Ouvi um tiro vindo
por trás. Sobressaltei-me e soltei um grito espontâneo.
Ao mesmo tempo, ouvi a arma que o homem tinha apontado á
minha cabeça a cair juntamente com ele.
- Ela não precisa de usar isso, topas? – falou uma voz
masculina, encantadora talvez. Olhei para a frente e um homem de chapéu, arma
na mão, sorriso astucioso e ,podemos dizer, sublime ou belo, como queiram.
Porque me defendera? Quem era ele? Pirata era de certeza, pelo estilo e falta
de higiene. Engoli em seco e fiquei parada com os olhos fixos nele. – Não é
preciso agradecer…
- Gabriel, a armar-te em justiceiro? – gritou alguém vindo
de trás, em tom baixo uma voz rouca, não
tão harmoniosa como a do que se encontrava á minha frente, mas de certeza um
pirata também, a voz rouca e bêbada assimilava-se á dele, á de Gabriel, pelos
vistos.
- Graham Smith, por aqui? – sorriu e andou de forma elegante
deixando todos os piratas, que agora já me pareciam de segunda ou terceira
categoria, todos de manso. Sorri inevitavelmente.
- Gabriel, não te armes em esperto, sabes perfeitamente o
que fazemos aqui. Ela – senti algo apontado para mim, pelo que o meu sorriso
desvaneceu-se por completo, deixando em vez disso, uma cara de pânico e horror
– é o premio.
- Capitão Smith, como se atreve a falar de uma jovem tão
bela como um premio, rude. – sorriu Gabriel, parando ao meu lado, guardando a
espada e apoiando-se no meu ombro direito. Olhei para ele nos olhos. Eram
cinzentos-claros, quase brancos, tapados pelo curto cabelo grisalho e loiro. –
Como sabe mesmo que é Ela que procuramos? –
procuramos? Mas este também me vai atacar? Ai por amor da santa…
- Quem mais podia ser Scobelr? É ela, tenho a certeza,
Shopie Bluter. Vejo-o nos seus olhos… - ele nem viu os meus olhos!
- Bem, Graham tenho de admitir essa foi profunda, tens
andado a treinar? – gozou Gabriel, ainda apoiado no meu ombro, que olhou por
alguns segundos.
- Scobelr, não me provoques! – aproximou-se e apontou a arma
á cabeça dele, pelo que tapei a boca com a mão que ainda tinha a espada, para
não soltar um grito histérico. Fechei os olhos e contei até 10 ao contrário e
abri-os, e rezei para estar tudo igual. Sim estava. Respirei fundo, demasiado
fundo para dizer a verdade . Senti ele a apertar-me o ombro, não sei em sinal
de quê mas calei-me e limitei-me a fita-lo com a máxima curiosidade.
- Smith… ouve…
- Não Gabriel ouve-me tu. – interrompeu Graham com um olhar
frio e assente, que deixou a com medo. Olhei-o pela primeira vez. Tinha uma
barba longa, branca e oleosa como o seu cabelo, maior parte escondido pelo
chapéu. Tinha os olhos negros, os lábios grossos e carnudos, o seu bafo era
gelado e a sua cara rugosa e vincada. Usava roupas mais trabalhadas que os seus
homens. Olhou para mim pelo que senti um calor frio, e um arrepio a passar-me
pela espinha. Voltou a virar-se para Gabriel, segurando a arma ainda mais
firmemente. – A única coisa que eu quero é ela, logo tu vais fazer isto. Vais
larga-la. Vais entregar-me a rapariga e fugir com o rabinho entre as pernas.
Percebeste?
- Ou…
- Nada de “ou’s” Scobelr podes começar, sabes esta vida é
muita complicada, e Ela vai facilitar-me os planos. – ai vou? Mas o que é que
eu tenho de especial, alguém me explica? Se eu conseguisse ter forças para
prenunciar algum som…
- Pois mas eu não vou. – outra pessoa? Mas isto é o que uma reunião
de piratas na minha casa?! E todos á minha procura não sei se deva ao não
sentir-me elogiada. Este tinha uma voz
semelhante á de Gabriel, mas mais pura e suave. Ouvi outro tiro, demasiado
perto de mim. Graham gritou e baixou-se de dores. Tinha-lhe acertado no calcanhar esquerdo. Gabriel pega na arma e
faz pontaria á cabeça de um dos homens
que se encontrava a atrás dele.
O rapaz que se encontrava pendurado no tecto, o que para já
é muito estranho, soltou-se do pedaço de madeira e calhou em cima de Graham e
sorriu. Tinha os cabelos negros atados atrás por um rabo-de-cavalo, mas este
não era grisalho nem nada que se parece-se, era limpo e brilhante, os seus
olhos eram verdes como uma brisa de primavera e um por de sol nascente. Era o
pirata mais bem apresentável que eu já tinha visto, pelo menos destes.
- Ryan, eu tomava conta do assunto. – declarou Gabriel com
os seus lábios finos e vermelhos vivos. Cumprimentou Ryan, o pirata de cabelo
normal, ao mesmo tempo que se desprendia do meu ombro, que agora sentia-se
livre mas vazio.
- Pois… notava-se Scobelr. Eu fico aqui a tomar conta deles,
leva-a para o White
Cover e vê o que sacas. O
Standtler quer “brincar”, sabes como é. – olhou para mim de relance e
analisou-me. Não sabia se devia sorrir ou não, mas foi o que ele fez, depois
fixou-se novamente no Gabriel e acenou com cabeça. Virou-se e a única coisa que
conseguia ouvir era o som dos tiros a ecoarem na minha cabeça e o pior é que
cheirava-me que tinha de me começar a habituar.
- Bem vá, levanta-te pequena donzela indefesa. – sussurrou
Gabriel ao meu ouvido e levou-me pelo braço de uma maneira calma elegante,
afastando todos o que se atravessavam no nosso caminho até algo que pela
conversa entre ele e Ryan, parecia ser um barco. White Cover. Ia-me levar a
Standtler, provavelmente um homem qualquer que me fará perguntas às quais eu
não sei responder porque não sei o que procuram de mim, nem quem sou. Jenks
disse para não dizer a ninguém quem sou nem dar o colar. Com a mão que não era
segurada por Gabriel meti o colar para dentro. Não sabia o que procuravam, mas
sentia que podia confiar nele… espero que o meu sentido não esteja errado.
Ele levou-me para dentro do meu quarto que tinha a porta
aberta. Tinha sido literalmente invadido por algum furacão. As gavetas estavam
todas abertas, os armários, a cama desfeita, os espelhos partidos e os cacos no
chão. Estavam definitivamente á procura de algo que me pertence, mas que pelos
vistos não tiveram sucesso.
Gabriel, espreitava atentamente pela janela também
arrombada, e possivelmente aguardava a chegada de algo. De um barco suponho.
Ainda não me soltara a mão. Acho que se esquecera que eu ainda me encontrava
ali.
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